Longe vai o tempo em que a gente olhando à noite via os campos do outro lado do rio vermelho ardendo em chamas; era a civilização Cristianópolitana que surgia nas florestas deste imenso brasil nos idos da década de 1960. Mais precisamente no ano de 1963 chega a primeira expedição com a bandeira Joaquim Oveiro para desbravar e colonizar a gleba boa vontade do sr: Flávio. O sr: Euclides Zeferino da Silva,conhecido como seo Nêgo da máquina comprou uma área de quarenta alqueires de terra no córrego da alegria, mas, resolveu não vir para mato grosso então ele pôs à venda e meu pai comprou dele dez alqueires, o Nextor Figueiredo também comprou dez alqueires e o Vital dos Santos também comprou dez alqueires.
Era quatro de agosto de 1966 entre dez e onze horas da manhã o Leopoldo parou o caminhão,um Mercedes bens LP 321 da gabina bege e carroceria branca e disse para meu pai: onde vamos descarregar a mudança? chegamos! Bem, a nossa história particular por enquanto fica por aqui, o sujeito da narrativa é Cristinópolis, ou, Cristianópolis como queiram que fale. Neste tempo o núcleo da cidade já estava demarcado e formado,já tinha ruas abertas,já havia os primeiros moradores, já tinha alguns bolichos, o Raulino estava numa esquina e o Gileno na outra em frente. O Jorge era o primeiro açougueiro,o Joel não tinha uma marcenaria bem montada mas se fosse para fazer algum pequeno móvel ou qualquer artefato de madeira ele prestava esses serviços,o Zé Dutra era o mecânico da cidade e nos bons tempos do verão caminhões de mudanças chegavam todos os dias trazendo gente de são paulo, minas gerais e também do espírito santo e grande era a euforia dos que lá já estavam havia mais tempo. Como grande povoação que se expande em todos os seus contornos Cristianópolis tinha, pode se dizer, nove regiões distintas alem da zona urbana que eram elas: 1ª)O córrego da goiabeira onde concentravam os capixabas ou, mineiros de Mantena como alguns diziam; gente de grande prestígio, varões de fama. 2ª) O córrego grande (córgão)onde moravam os irmãos Abrão. 3ª) O córrego da alegria onde concentrava a família Morais e lá também estava o nosso sítio. 4ª) O córrego do escondido nos confins da gleba boa vontade, este era um dos lugares mais distantes da vila. 5ª) A fazenda do Pedrão no córrego seco, ali também estava a fazenda do João Mineiro. 6ª) A estrada do Angelim onde também morava o sr: Manuel Bispo e família. 7ª) A região do rio vermelho onde estava as terras do Melquíades. 8ª) O córrego da jacutinga já nos confins da gleba do lado do levante. 9ª) E a maior e mais povoada região era o ribeirão tucanguira,neste ribeirão tucanguira tem uma cachoeira que em certos tempos ela emite um som estridente que é houvido à léguas de distância. Aí nessa região do tucanguira que já se mostrava gigante pela própria natureza o sr: Marinho fundou uma cidade em 1969 por nome de São Jorge, como se fosse uma extensão da metrópole Cristinópolis. Em meio a essa multidão de aventureiros que adentrava o sertão de mato grosso em busca do ELDORADO vieram também alguns mais abastados que trouxeram alguns recursos como caminhões, máquina de arroz, carrinhos de roda dura etc. O Pedrão trouxe um caminhão e tinha um armazém,o Angelim trouxe um caminhão, o Justino que era conhecido como Nêgo Amâncio trouxe um caminhão e uma máquina de arroz, logo depois o João Mineiro comprou um jipe, o Amaro engenheiro também comprou um jipe velho para trabalhar na topografia e fazer algum frete. Na lataria do jipe estava escrito estes dizeres: (capota véia é a tua avó). Os intelectuais Zezé Oliveira e o Alcides, o (Alcidinho)foram os primeiros professores do sertão de Cristianópolis. A dª. Aurelina e a dª. Augusta eram quem assistiam as mães na hora de dar à luz. No verão de 67 foram feitos alguns mutirões para consertar a estrada que dava acesso à cidade de panorama. O Otávio,filho mais velho do Joaquim Oveiro, como príncipe herdeiro não trabalhava, ele ficava só de boa em cima do caminhão,uma vez ou outra ele entoava essa melodia: manhêêêh, o Tonico me bateu, roubou meu saco de pipoca o pirulito e o picolé!;
foi ele quem tirou as fotos da nossa mudança na hora em que chegamos. Com a estrada em boas condições então chegavam os marreteiros com mercadorias para vender ou trocar por arroz em casca. Entre eles estavam o Chazinho de Urânia que tinha um chévi da gabina roxa, o Toninho Munhoz de Jales, ele tinha um Mercedes 1111, o Isaías Loura de Amorim de Votuporanga, este foi quem pôs o primeiro grande armazém em Cristianópolis, a CASA NOVA,cujo gerente era o Mário, no dia da inauguração ele vendeu R$ 1.000.000,00 (hum milhão de cruzeiros). Passaram se alguns anos entramos na década de setenta e o temido ano setenta chegou; ainda na década de sessenta os mais velhos diziam assim: quem passar do setenta terá muito o que contar, e para Cristinópolis veio o progresso em todas as suas dimensões. O centro financeiro de Cristianópolis já estava formado, na avenida Tavares e adjacências já existia lojas de roupa, o sr: Albino foi quem trouxe a primeira lojinha de roupas para Cristinópolis,padarias, bazares, eu comprei um almanaque do pensamento ano 69 no bazar BOA SORTE do Manuel Pernambuco, tinha sorveterias e as lojas de roupas e confecções aumentaram, para comprar roupas já não precisava mais de ir à Cáceres,no ano de 68 o Chico Mota foi em Cáceres mais a esposa, dª.Doralice e compraram R$ 600.000,00 em roupas. O Narciso trouxe as primeiras mesas de bilhares,o Marcelino também tinha um pequeno açougue na esquina da avenida Tavares com a avenida Brasil,máquinas de arroz eram sete. A rodovia chegou no ano 1970, no mês de outubro eu me lembro muito bem. O Juvenal era conhecido do meu pai desde os tempos de Tanabi,ele trouxe uma farmácia bem montada,tinha até leito para alguns casos mais graves,e, também o Zé dentista já estava lá prestando seus serviços à população. Para os que ganhavam a vida a jornal agora já havia muita procura de gente para trabalhar nas construções e o tempo da poalha foi ficando para traz, quem chegou a fazer comida com óleo de coco babaçu agora tinha muita fartura. Cristianópolis foi abrigo de grandes figuras populares,;quem não se lembra do astrólogo,médium e poliglota Mané da Lua? enquanto russos e americanos disputavam a corrida espacial ele encantava todo mundo narrando suas missões bem sucedidas na lua,-sim ele ia na lua!. Por lá também passaram grandes astros da música sertaneja tais como: Jangada e Remador,Tom e Taguari, Joãozinho e Zezinho assim como Railto e Rialto que se apresentavam nos salões e nos parques de diversões. No estilo nordestino tinha o Pau-de-arara que entoava seus baiões no violão e também fazia algumas mágicas como se fosse um ilusionista profissional. Os bons sanfoneiros eram o Gumercindo e o João seu irmão,o Jessiel,o Dominguinho e o Jerônimo. O Pedro Nicolau era um bom violeiro e ainda falando do Pau-de-arara ele também executava muito bem um cavaquinho. O Edgar volta e meia instalava lá seu parque de diversões que foi na verdade o maior palco das apresentações artísticas em Cristianópolis. O Roberto ensaiava um movimento juvenil para animar a juventude de Cristianópolis em que ele apresentava algumas canções e até mesmo alguma atividade esportiva,ouça este refrão:(mocidadeeh, teu nome é valorh). Mas Cristianópolis não viveu só de palcos e fanfarras lá também teve bons cientistas, os irmãos Arruda (Pedro e Eli) chegaram a montar uma emissora de rádio (pirata)a rádio nacional de Cristianópolis que por sinal foi sintonizada até no Salto do Céu. O Aparecido Scott era engenheiro agrônomo e depois ele comprou e restaurou a máquina de arroz da família Nêgo Amâncio(lamentamos a morte prematura do Nêgo Amâncio que foi acometido por uma ferida na perna e não teve cura) O Eldo também estudou e se formou radiotécnico pelo Instituto Universal Brasileiro, lá ninguém ficava sem um(caixão de abelhas)pra fazer barulho em casa.
E assim se via estampada em cada rosto a euforia de um povo bravo e corajoso que heroicamente galgava as barreiras do sertão vencendo dificuldades e superando crises das mais diversas na esperança de um amanhã melhor. Uma civilização cheia de vigor que mais tarde atravessou o rio vermelho e fundou mais uma cidade: a Nova Lucélia cuja fundadora foi a Dª Aurelina. E continuaram rumo ao norte e chegaram até ao rio sepotuba. Cristinópolis atingiu seu apogeu na primeira metade dos anos setenta do século XX; surgiram as duas igrejas evangélicas e a católica,os capixabas tomaram frente e construíram a usina hidrelétrica no córgão. Neste tempo o grupo escolar estava em funcionamento e o mobral também já tinha chegado lá. O Alfredo Parvinha formava mudas de café e o Tatito montou uma marcenaria bem equipada e tinha uma C14. Alguns fazendeiros já tinham tratores e outros possuíam trilhadeiras de arroz para servir nas colheitas. O Joaquim Oveiro chegou a ser vereador por Cristianópolis. Lá também residiu grandes mestres de obra, o sr: José Filipe, o sr: Manuel Salmeirão, o sr: Orlando Esperandio e o mais conhecido deles o sr: Nito que se deslocava em sua Motinha Honda de 50 cilindradas. Quanto aos costumes daquela época já que não se tinha opção de lazer a criançada brincava de roda nas noites de luar. O sr: Lazinho tinha três filhas pequenas que cantavam essa modinha: lá vem a chuva, toda molhada;vem cá meu bem,toda molhada;me da cá teu chapéu, toda molhada, uma tirava o verso as outras cantavam o refrão. Nos finais de semana todo mundo se ajuntava lá na casa do Pedrão onde se fazia quermesse para a igreja católica, começava se a festa com o leilão e depois seguia algumas horas de danças em bailes tocados a sanfona e violão. No começo do ano 1967 os capixabas fizeram la uma apresentação do (bumba-meu-boi). Mas como toda nação tem em meio a suas glórias algum momento triste Cristianópolis não foi diferente, chegou a notícia da morte de seu fundador o Joaquim Oveiro. O fim da era Joaquim Oveiro marcou também o início da decadência de Cristianópolis,as famílias mais pobres foram se evadindo sutilmente em busca de lugares que oferecia melhores oportunidades. Os pequenos proprietários foram vendendo suas terras e se mudando também. Uns procuravam novos sertões, outros voltavam para são paulo ou iam para outros estados. E, assim,pouco a pouco como numa diáspora interminável aquele povo que outrora foi ditoso e hospitaleiro vai um após outro deixando nua e desolada a solitária Cristianópolis. Quem porventura passar por lá por acaso ou sem rumo a vaguear certamente comovido há de murmurar sentindo as dores da ingratidão. Mas Cristianópolis ainda tem lá uns remanescentes, uns poucos que ainda ficaram na esperança de que um dia ainda verão seus sonhos realizados. Pode ser que la um dia um novo tempo surgirá em que as gentes buscarão em Cristianópolis o conforto que desejam.
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