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CRISTINÓPOLIS MT

CRISTINÓPOLIS MT

12
Fev18

12ª Narrativa

EU MESMO Quero Ler

O Zé Marmelo.png

Zé Marmelo

Aqui também recordamos mais quatro famílias pioneiras que estiveram la desde o princípio que são elas: Otaviano,Alcides,Gelson e Osvaldinho.As poesias não são bonitas palavras em perfeita métrica mas reflete a realidade desta biótica indomável onde cada integrante cumpre sua parte. O homem da roça que vive da agricultura de subsistência às vezes de terra arrendada ou num seu pequeno sítio que cria galinha e tem também uns porquinhos para ajudar no orçamento. Também pode ter la alguma vaquinha leiteira, um engenho de cana para fazer suas rapaduras, possui um carrinho de roda dura ou de pneus. Que tem seus animais cavalares e faz de seu mandiocal suas boas e alegres farinhadas. Ou que seja um pouco mais pobre ou que tenha até mais recurso este é o homem sertanejo que representa a cultura brasileira. Por ser gente da roça ele não tem e talvez nem necessite uma boa escolaridade. Sabendo as quatro operações básicas ele já tem conhecimento suficiente para sobreviver e fazer os seus negócios. É plantar e colher, criar os filhos e passar as tradições para as gerações futuras. Mas nem imagina que sorte o destino traiçoeiro lhe prepara. As gerações do século XX são filhos de uma cultura transacional cujos pais serviram os barões do café. Foram criados nas colônias das grandes fazendas num regime de semi-escravidão juntamente com aqueles que haviam se libertado da escravidão há pouco. Com a vinda dos europeus e a imigração japonesa foi surgindo à modalidade das pequenas propriedades rurais e muita gente chegou a formar sítios, chácaras e fazendas. E adentrando o sertão paulista assim como em outros estados, as famílias foram conquistando cada um seu lugar ao sol. Também tinha la os que moravam nas vilas e trabalhavam como mascates na zona rural os famosos “oveiros” que vendiam suas mercadorias e compravam galinhas, ovos e outros produtos da roça, já que neste tempo a população da zona rural era maior do que a da cidade. Quando as propriedades já estavam desbravadas e formadas muitas famílias saíam Brasil a fora em busca de novos sertões. Foi assim que Belizário de Almeida formou uma cidade no estado de São Paulo (Santa Albertina) e outra no estado de Mato Grosso (Nova Olímpia). Criado na roça, portador dos modos e costumes do sertão o Zé Marmelo não exibe pompa nem luxo de espécie alguma. Montando um cavalo bom e arreado, amestrado para todos os seus serviços. Sem ostentar reluzentes argolas, com pelego simples e esporas de latão ele albarda seu pantaneiro e sai alegre a cumprir sua missão. De chapéu de palha, chinelo de dedo e vestindo uma camisa amarela de viscose ele deixa se confundir com os bons vaqueiros a bagualhar no pantanal mato-grossense: são as memórias de quem chora os bons tempos la da roça! Hoje na cidade grande tudo tem que ser diferente; até uma espiga de milho verde, uma melancia ou um cacho de banana tem que ser comprado a dinheiro. E mais complicado ainda para quem não tem formação acadêmica nem foi contemplado com um bom concurso publico. E trabalhando na construção civil não são todos que tem a sorte de fazer muitos anos de casa. O Zé Marmelo também é um desses que não conseguiu recursos para construir uma boa morada e teve que fazer um ranchinho na beira do brejo, com uma picadinha no mato para manter o terreiro limpo. Longe do centro e com pouca vizinhança, mas com a satisfação de não ter que pagar aluguel. Esse é o personagem que inspira o homem das nossas gerações. Bom empregado que era quando ainda muito jovem cheio de vigor Zé Marmelo não dava o que falar, trabalhava dia e noite para ajudar o patrão e, assim manter o bom nome. Trabalhava na roça de sol a sol e ainda ajudava o patrão nalgum serviço de mantenimento do sítio tais como: consertar uma cerca do pasto ou do chiqueiro. Apartar os bezerros e ainda levantava de madrugada para tirar o leite pro patrão se preciso fosse. Lá uma vez no mês se o patrão o pedia ele dava uma volta ao redor da propriedade para averiguar as cercas de arame farpado nas divisas do sítio. Quando precisava ele também ajudava fazer os aceres na prevenção de incêndios. Também quase sempre ele acompanhava as crianças no caminho da escola na ida e na volta, as dele e as do patrão. Se alguém no sítio ou na vizinhança precisasse tomar algum medicamento era ele quem aplicava as injeções. As vantagens que ele tinha era que o leitinho das crianças era garantido e se ele precisasse de algum dinheiro o patrão fornecia para receber nos acertos anuais. As terras eram arrendadas para lavoura branca, os cafezais eram á meia e, quem tinha um pequeno sítio arrendava terra para completar o tanto de lavoura que poderia tocar. Os tratores eram de tamanho pequeno demais para desbravar as terras. Muita gente ganhava por dia nas grandes fazendas arrancando toco de enxadão e machado ou picareta. E muitas fazendas ainda mantinham colônias com muitas casas para acomodar os trabalhadores mais desfavorecidos. Se tudo continuasse assim a roça seria um verdadeiro paraíso principalmente para quem não tem previsão e planejamento. E nem precisava ter um bom nível escolar. Mas não tardou em surgir os visionários com projetos formidáveis de mecanização das terras. Por outro lado o governo também foi criando leis de amparo aos trabalhadores e, acurralados os grandes proprietários, “para não dizer latifundiários” foram trocando a mão-de-obra braçal pelos maquinários e os que não aprenderam os novos ofícios tiveram que se debandarem para as cidades grandes. Quem não sabia cortar cabelo ou que não era motorista tinha que vender picolé na rua ou trabalhar de servente de pedreiro nas construções. Muitos até aprenderam a trabalhar de pedreiro ou armador, ou até mesmo de carpinteiro como é o caso do nosso amigo que ilustra este livro, o Zé Marmelo. Passados trinta ou quarenta anos da nova vida num mundo em que ele não foi criado, tendo já os filhos todos crescidos e cada um seguindo seu destino. Agora o patriarca que veio do sertão acha-se só em casa com a esposa e algum neto que adotou. As crises se intercalam com as poucas fases de bons tempos e a casa que o homem da roça começou a construir há anos continua na espera de um bom e almejado acabamento. As gerações que nasceram depois do êxodo rural por estar mais adaptada aos novos tempos têm mais oportunidades, até porque já aproveitaram mais as escolas e até mesmo se formaram nalgum curso profissionalizante. Esses já possuem até um carrinho popular e às vezes uma casinha de COHAB e/ou uma motinha de 150 cilindradas. Muitos deles também migraram se para a Europa ou América do norte, ou ainda o Japão na esperança de ajuntar uma boa soma de dinheiro para construir uma base social mais justa, mas não são todos que tem este privilégio. Alem do mais o estrangeiro é um destino que requer muita cautela, pois la repentinamente surge os atentados terroristas, desastres naturais que causam grandes estragos tais como: terremotos, tsunamis e até quedas de meteoros como o que caiu na Rússia. Ou seja: não é um pé-de-chinelo que vai conseguir tirar bons proveitos numa eventual epopéia num mundo de fantasias. Inspirado nos antigos armazéns de duas ou três portas com tuia de mantimentos e balança filizola em cima do balcão o Zé abre uma mercearia no seu bairro para vender secos & molhados, cereais e legumes. La no interior os agricultores compravam açúcar em sacos de sessenta quilos, latas de querosene de vinte litros, fardos de macarrão, sacos de sal com trinta quilos por fazer uma compra por ano. Na cidade grande os operários recebem seus salários semanalmente ou mensal o que as compras também são feitas em menores quantidades. Apesar disso surgiram os grandes supermercados no sistema peg-pag com promoções e ofertas de cair o queixo. O que um comerciante de pequeno porte não se atreve a fazer assim. Resultado: os bolichos caíram de moda e as feiras de bairro enfraqueceram muito. Também uma franquia nos grandes centros comerciais exige uma boa soma de dinheiro para um sólido capital de giro sendo assim mais uma expectativa frustrada para o nosso homem modelo. Mas a cidade poderia dar boas oportunidades para o homem que veio da roça para quem puder explorar os concursos públicos ou ainda tentar a sorte num pleito eleitoral não fosse o fato do Zé Marmelo ser também analfabeto. A venda de produtos de porta em porta ou mesmo vender salgados na praça também não é para todos que da um bom resultado. Alcançando a idade mais madura fica mais difícil arrumar um emprego e, não tendo contribuído com a previdência bastante o suficiente até uma aposentadoria mais cedo é quase impossível. O homem da camisa amarela se vê num mar de dificuldades para resolver seus problemas. Este é o fadário daqueles que vieram do êxodo rural e não encontrou ainda em seus refúgios o amparo que buscam sem levar em conta o tempo que já passou. Com as notícias que se ouvem todos os dias no radio e na TV muita gente "para não dizer quase todo mundo" fica entusiasmado com as vantagens anunciadas e muitos decidem ir tentar a sorte la nesses paraísos. Muitos até mesmo clandestinamente correndo todos os riscos de um mais que provável fracasso. A onda que trouxe as massas contingenciais da roça para a cidade grande agora espalha os degredados mais ainda empurrando-os para o exterior. Mas os mesmos canais de informação que anunciam o progresso das nações industrializadas falam também dos malfadados aventureiros que peregrinam la nas terras do tio Sam sem emprego e sem documentos. Mas o herói sem medalha que inspira esse romance, o lendário Zé Marmelo, já experimentado em tantas frustrações e desacertos sabe esperar um bom momento e não se atreve a tomar uma decisão temerária.

I

Eu conheço um camarada

Que se veste de amarelo

Sua vida é engraçada

Seu nome é Zé marmelo

Que trocou o cabo da enxada

Pelo cabo do martelo

II

Foi o usucapião Que tirou ele da roça Quem deu lucro pro patrão Hoje mora numa choça Sem dinheiro e sem quinhão O coitado tá na fossa

III

La pra roça ele não volta Pois não tem financiamento Na política não ingressa Pois não tem conhecimento Vai vender pastel na praça Não ganha nem dez por cento

IV

Certa vez o Zé marmelo Abriu uma mercearia Pra vender de cereais A miudeza e melancia Mas veio o supermercado E roubou-lhe a freguesia

V

No tal de primeiro mundo Que tem tecnologia Não existe miserável A imprensa anuncia Mas não é pé-de-chinelo Que tem essa regalia

VI

Lá o povo é ensinado E preparado pro batente Às vezes sob a neve Às vezes no tempo quente E ainda tem os atentados Quando surgem de repente

VII

Agora surgiu uma moda nova A tal de globalização Começou não se sabe onde Foi talvez la no Japão É mais um indicativo De uma nova escravidão

VIII

Inventaram tanta lei Que é só barbaridade Tem o iso nove mil Controle de qualidade Que exige rendimento E não pode ser de idade

IX

A vida do Zé marmelo Reflete a de muita gente Que uma vez deixando a roça Num passado mais recente Busca na cidade grande Uma vida mais decente

X

Quem tiver pena do Zé Faça uma rogação Aos poderes constituídos Um momento de atenção Que ao menos ajude o Zé A voltar la pro sertão

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